Quinta-feira, Março 28, 2024
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Entrevista a Rui Oliveira

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Muitas pessoas assumem que é formado em economia ou gestão. Mas, na verdade, Rui Oliveira é licenciado em Antropologia Social. Aos 53 anos, trabalha numa instituição bancária na região e é presidente da Direção do Centro Social da Freguesia de Famalicão há sete anos. O famalicense, que integrou os órgãos sociais da instituição como vice-presidente, acaba por ficar ligado à história do Centro Social num dos momentos mais marcantes: a construção da sede. Casado e com três filhas, duas delas gémeas, Rui Oliveira veste a camisola da instituição social, que tem em curso a construção do projeto da Estrutura Residencial para Idosos. 

Três anos depois da inauguração das instalações do Centro Social da Freguesia de Famalicão, o presidente da Direção da instituição fala do desafio de concretizar um dos maiores projetos da instituição: a construção de uma Estrutura Residencial Permanente para Idosos (ERPI).

REGIÃO DE CISTER (RC) > Depois da conclusão das instalações, há três anos, qual é o próximo grande passo do Centro Social de Famalicão?
Rui Oliveira (DF) > A estrutura para idosos faz parte do objeto social da instituição. Quando o Centro Social foi fundado em 1999, tinha como objetivo gerir uma creche, um centro de dia, um centro de apoio domiciliário, ATL e um lar. Ao longo da história foi sendo desenvolvida a atividade em instalações provisórias, que não reuniam as melhores condições e, há três anos, conseguimos concretizar a sede, num edifício administrativo, de gestão e também com as respostas sociais de creche e centro de dia, com os refeitórios, etc. Pela dimensão do projeto de ERPI tomámos a decisão consciente de dividir em duas fases. Passados três anos, avaliámos a experiência que decorre do funcionamento da instituição na sede e o resultado superou as nossas expectativas e decidimos avançar para mais uma resposta social.  

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RC > Durante estes três anos, foi possível crescer a pouco e pouco…
RO > O pouco tempo são três anos. E três anos para todas as dinâmicas acontecerem é muito positivo, e não é assim tanto tempo. É uma coisa que foi acontecendo. Às vezes até nos surpreendemos quando percebemos que estamos aqui há três anos. E criar estruturas de raiz, técnicos, colaboradores, auxiliares de ação direta, as dinâmicas de saída, transportes… Conseguir construir isto e ter neste momento esta resposta não é fácil e às vezes até nos preocupa a procura que os nossos serviços têm porque vai chegar um momento em que vamos ter de dizer “não” e não queremos esgotar as nossas capacidades licenciadas. Consideramos que isso não é uma boa política em termos de qualidade e de imagem de serviço. E chegamos a um momento em que pensamos: o que é que vem a seguir? Temos duas hipóteses que discutimos muito. Há uma maneira que é olhar para o que já conseguimos fazer, estarmos satisfeitos e fazer uma gestão calma, tranquila, e deixar estar. Mas consideramos que isso é o pior que se pode fazer, é entrar num processo de estagnação em que se perdem dinâmicas, as coisas deixam de acontecer.

“Uma gestão calma e tranquila […] é entrar num processo de estagnação. As instituições têm de estar sempre a trabalhar e promover novas respostas”

 

RC > E é assim que surge o novo projeto do lar residencial?
RO > Sim. Temos de estar sempre a trabalhar e as instituições têm de estar sempre a promover respostas. Esta realidade da terceira idade coloca-se não só num âmbito de freguesia, nem só do concelho. Assumimos com abertura que é uma resposta para o concelho mas tendo em consideração que será também para os concelhos limítrofes. Fizemos um estudo, visitámos várias instituições com esta resposta e andamos a ver o que queremos fazer mas sobretudo olhámos para aquilo que não queremos fazer. Portanto, vamos tentar fazer diferente. Desde logo a conceção da arquitetura do espaço considera soluções diferenciadas para as restantes instituições. Isto foi um processo longo, que dura há sensivelmente dois anos, já tivemos de refazer muito do projeto de arquitetura mas quisemos ir evoluindo com este trabalho de campo. Não nos precipitámos, vimos coisas boas que vamos tentar replicar mas vamos evitar repetir alguns dos erros que foram identificados.

RC > A construção da estrutura residencial pode avançar brevemente?
RO > Estamos bastante animados porque rapidamente poderemos colocar o projeto para licenciamento e as obras podem arrancar brevemente. Mas isto levanta-nos outro problema e desafio: financiar a construção do projeto. É outro tema. Temos uma expectativa muito importante de recorrer a fundos comunitários no âmbito do programa Portugal 2020. Temos indicações que durante este ano começarão a sair algumas linhas de financiamento para as IPSS. E vamos aproveitar para isso. Estamos atentos mas temos sempre um plano B, que será sempre um investimento muito pesado porque estamos a falar num investimento na ordem dos 2 milhões de euros.

“Temos a expectativa de recorrer a fundos comunitários para financiar a construção da estrutura residencial”

RC > Após o estudo feito em outras instituições, qual é o estado das respostas sociais para a terceira idade na região?
RO > É igual em todo o lado. E está cheio. Esgotado e com listas de espera. E isto tem um efeito que podemos considerar perverso. Como a resposta está cheia a expectativa é baixa. O que houver já é bom. Mas isto é pouco desafiador e não queremos isto. Percebemos esta análise mas não a queremos assumir. A rentabilidade da resposta não é o que nos move, mas sim a garantia de um cuidado adequado à realidade de cada um dos utentes. Dentro das mesmas instituições há sempre utentes muito distintos, que precisam de cuidados também muito distintos. Mas o que temos vindo a observar é que são tratados todos da mesma forma. Tem de haver diferenciação de tratamento, as próprias atividades não podem ser as mesmas para quem tem uma demência e quem não tem. Um exemplo muito simples: nem todas as pessoas em respostas sociais deste género precisa ou quer lanchar sempre à mesma hora. Mas é isso que acontece: às 16 horas têm de ir lanchar. Assim é mais fácil mas não estamos aqui pela facilidade, queremos apresentar uma diferenciação e individualidade dos utentes. Queremos que as pessoas venham para uma resposta destas por opção e não por uma fatalidade. Que pessoas cheguem a um certo momento das suas vidas e queiram vir para uma ERPI para estar, para ter um serviço e um conjunto de respostas que de outra forma poderia não conseguir. Queremos imprimir a ideia de que não se vem para estas instituições só quando não se está bem.

REGIÃO DE CISTER (RC) > O que leva um bancário a envolver-se na Direção de uma instituição como o Centro Social da Freguesia de Famalicão?
RUI OLIVEIRA (RO) > Há uma vertente do “social” que já trago comigo. A minha formação base é precisamente na área das ciências sociais e não propriamente na área da gestão, apesar de a minha vida profissional ter estado sempre muito ligada às empresas e à gestão. Depois, tem que ver com algo que por vezes não consigo explicar: quando fui convidado para integrar a Direção, como vice-presidente, não sabia ao que vinha. Desconhecia a realidade do que é o trabalho de uma instituição destas, sabia que havia um projeto para concretizar [construção de uma sede] e que era um anseio muito antigo. Comecei a envolver-me e é o tal sentido e espírito de associativismo. Não consigo explicar. É uma coisa que se vive, sente-se mas não sei explicar. Vesti a camisola e às vezes isto parece quase uma obsessão de atingir os objetivos.

“Dentro das mesmas instituições há utentes distintos, que precisam de cuidados muito distintos. Mas o que temos observamos é que são tratados da mesma forma”

RC > É a concretização de objetivos que o move?
RO > Fazer algo que seja útil e socialmente reconhecido para ajudar os outros. Isto é o que me move. Sentir que partilhamos algo. Mexe ao nível das emoções e do sentimento de utilidade de nós próprios. Quando vivemos em comunidade faz sentido podermos contribuir dentro das nossas capacidades, competências e conhecimentos. Isto vai crescendo internamente. Há processos de expansão e necessariamente também tem um processo depois de algum desgaste. O associativismo tem de ser bem gerido para que a essência não seja deturpada. Tem de ser uma gestão muito consciente. Pessoalmente é isto que me move. Deixar este percurso de uma forma que tenha a continuidade com outras pessoas, tendo sempre presente que um dia retornarei. Mas fica o sentimento claro que temos de marcar as distâncias para não haver perturbações do espírito verdadeiramente associativo. O que me move é algo difícil de explicar em palavras, mas é um pouco isto tudo. Foi um processo gradual porque, como disse, cheguei sem saber bem o que vinha fazer ou como é que se fazia. Havia o objetivo de construir a sede. Mas não sabíamos como o fazer mas lá conseguimos. E todas estas vitórias, pequenas e grandes, que fomos conseguindo, acabaram por me motivar e por me empolgar ainda mais. Sinto um grande orgulho por pertencer a uma “casa” destas.

RC > Está ligado a mais de metade da história da instituição. Que contributo é que tenta imprimir no Centro Social?
RO > Trabalho muito as ideias, acabo por lançar ideias, dinâmicas e criar iniciativas. Estamos sempre a trabalhar. A ideia do “agora estamos bem, não é preciso fazer mais nada” é o primeiro passo para começarmos a definhar. E é isto que tento imprimir diariamente. Porque todos os dias há assunto, porque venho aqui todos os dias. Não cobro nada à instituição porque a instituição também nos dá muito. Todos os dias penso no Centro Social. E este processo pode tornar-se um pouco desgastante. Até com alguma violência. E para preservar o espírito associativo temos de ver a forma de poder continuar a contribuir na instituição de forma também a não nos perpetuarmos nos lugares para que não haja perversões, por exemplo, deixar de ser pelo sentido de missão que cá estamos e originar casos que foram notícia recentemente em que os dirigentes se confundem com a instituição. Não tenho, nem podia ter, a esperança de um retorno ou de uma compensação. Porque isto deturpa o espírito associativo. O pior que pode acontecer é estagnar as instituições, é preciso refrescar as estruturas para que o trabalho possa continuar a decorrer da melhor forma. Esta é basicamente a minha filosofia. 

“Pensámos o lar como se fosse para ser utilizados por nós”

RC > Qual é o papel do Centro Social na comunidade em que se insere?
RO > O Centro Social da Freguesia de Famalicão tem um papel importante na freguesia, não só pelas respostas sociais que presta mas também pelos postos de trabalho. Atualmente a instituição tem 35 trabalhadores, número que pode subir até aos 55 com a construção da Estrutura Residencial Permanente para Idosos. Já é um número muito significativo para uma freguesia com a dimensão de Famalicão. Além disso, temos a capacidade da creche praticamente esgotada. No passado mês de setembro arriscámos em abrir mais uma sala para a creche e tivemos muitas inscrições. Temos uma realidade muito interessante na creche, em que muitas das nossas crianças até são oriundas de outras freguesias. E isto dá-nos a expectativa de que com a frequência da creche no centro social promove-se a continuidade do ensino nas pré-escolas e escolas primárias da freguesia. O que é muito importante para Famalicão por assegurar um fluxo de crianças que faz com que todo este sistema funcione.

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